A saúde é precária

Desenvolvimento econômico é um meio indispensável à consecução da meta que deve ser a mais importante de qualquer governo democrático, o desenvolvimento social, humano. Mas este não se mede exclusivamente por números. É um engano – quando não pura mistificação – o ufanismo que se apressa em colocar o Brasil com um pé no seleto grupo das grandes potências desenvolvidas, quando nossa realidade social ainda aponta em direção oposta. Isso é o que demonstra a matéria de quarta-feira do correspondente do Estado em Genebra, Jamil Chade, apoiada em levantamento feito pela Organização Mundial da Saúde (OMS): apesar de sermos a sexta economia do planeta, os gastos com saúde no País, mesmo tendo aumentado nos últimos anos, mantêm-se abaixo da média mundial, equiparando-se à realidade africana.

Na média internacional, os gastos com saúde são da ordem de 14,3% dos orçamentos nacionais. No Brasil, a taxa é de 5,9%. E era de 4,1% em 2000. O crescimento nos últimos 12 anos, porém, ficou longe de equipará-los à média do planeta. Além disso, enquanto nos países desenvolvidos um terço dos custos da saúde é pago pelos cidadãos, no Brasil 56% do que se gasta nessa área sai do bolso dos contribuintes, situação que é semelhante à que ocorre em somente 30 dos 193 países-membros da ONU.

Nos países europeus, revela o estudo da OMS, os gastos médios dos governos com cada cidadão chegam a ser dez vezes superiores aos do Brasil. Em alguns casos, como Luxemburgo, gasta-se mais de US$ 6,9 mil por cidadão, quase 25 vezes o valor no Brasil. Mesmo na Grécia, que hoje vive uma catástrofe econômica, são destinados seis vezes mais recursos a cada cidadão do que no Brasil.

Outro dado que revela como é alarmante a situação da saúde pública no País: nossa média brasileira de 26 leitos hospitalares por 10 mil habitantes é igual à de Tonga e do Suriname. Outros 80 países ostentam um índice melhor que o nosso. Na Europa, a oferta média de leitos é três vezes maior.

A boa notícia no levantamento da OMS é que o Brasil conta com 17,6 médicos para cada 10 mil habitantes, enquanto a média mundial é de 14/10 mil. Lembramos, todavia, que o problema aqui não é de escassez de médicos, mas de concentração desses profissionais nos grandes centros urbanos por falta ou precariedade das condições de trabalho em boa parte do País. De qualquer forma, na Europa, a média sobe para 30/10 mil, enquanto na África fica em baixíssimos 2/10 mil.

Desde o ano 2000 o Brasil triplicou o investimento público por habitante no campo da saúde. Naquele ano, foram investidos US$ 107 por ano para cada habitante. Ao final da década, em 2009, essa cifra havia sido elevada para US$ 320 por habitante/ano. Mas, segundo a OMS, a média mundial era então de US$ 549 por habitante/ano. Estudo do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), mostra que o aumento do investimento público em saúde a partir de 2000 permitiu que, em 2010, ele representasse 3,77% do Produto Interno Bruto (PIB). Mas seria necessário duplicá-lo para que atingisse o mesmo nível médio do padrão internacional de 7%.

Quando se sabe que saúde é um dos fatores levados em conta na apuração, pela Organização das Nações Unidas (ONU), do Índice deDesenvolvimento Humano (IDH), não é de estranhar que o Brasil ocupe uma modesta 84.ª posição na lista divulgada em novembro do ano passado por aquela organização com a classificação do IDH de seus quase 200 países-membros. Entre os países latino-americanos, com a Argentina em primeiro e o Uruguai em segundo lugares, o Brasil está em 14.º, atrás de “potências” como as ilhas caribenhas Antígua e Barbuda, Trinidad e Tobago, Dominica e Santa Lúcia.

Junto com a saúde, a educação é outro indicador fundamental do nível de desenvolvimento humano em um país. Pois, se na saúde não vamos bem, pior estamos indo na educação, como indicam pesquisas como a que foi recentemente divulgada pelo Centro de Estudos da Metrópole (CEM), da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp). Tema para outro editorial.

O Estado de S.Paulo- 21/05/12