CONASS Informa n. 46 – Publicada a Resolução CNS n. 569 que reafirma a prerrogativa constitucional do SUS em ordenar a formação dos (as) trabalhadores (as) da área da saúde

RESOLUÇÃO CNS N. 569, DE 8 DE DEZEMBRO DE 2017

O Plenário do Conselho Nacional de Saúde (CNS), em sua Trecentésima  Reunião  Ordinária,  realizada  nos  dias  7  e  8  de dezembro de  2017, e no uso  de suas competências  regimentais e atribuições conferidas pela Lei no 8.080, de 19 de setembro de 1990; pela Lei nº 8.142, de 28 de dezembro de 1990; pela Lei Complementar nº 141, de 13 de janeiro de 2012; pelo Decreto nº 5.839,  de  11  de  julho  de  2006;  cumprindo  as  disposições  da Constituição  da  República  Federativa  do  Brasil  de  1988,  da legislação brasileira correlata; e

Considerando que o art. 196 da Constituição Federal de 1988, garante que “a saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido  mediante  políticas  sociais  e  econômicas  que  visem  à redução  do  risco  de  doença  e  de  outros  agravos  e  ao  acesso universal  e  igualitário  às  ações  e  serviços  para  sua  promoção, proteção e recuperação”;

Considerando que o art. 197 da Constituição Federal de 1988 determina que são de “relevância pública as ações e serviços de saúde, cabendo ao Poder Público dispor, nos termos da lei, sobre sua regulamentação, fiscalização e controle, devendo sua execução ser feita diretamente ou através de terceiros e, também, por pessoa física ou jurídica de direito privado”;

Considerando   que   a   Constituição   garante   no   art.   198, incisos II e III, o atendimento integral, com prioridade para as atividades preventivas, sem prejuízo dos serviços assistenciais e a participação da comunidade”;

Considerando que, nos termos do art. 200, inciso III, da Constituição Federal de 1988, é competência do Sistema Ú nico de Saúde  (SUS),  além  de  outras  atribuições,  “ordenar  a  formação  de recursos humanos na área de saúde”, diferentemente de “participar” ou “colaborar” como em outras competências do mesmo artigo;

Considerando  que  o  art.  209,  inciso  I,  da  Constituição Federal de 1988 faculta que “O ensino é livre à iniciativa privada, atendidas as seguintes condições: cumprimento das normas gerais da educação nacional” cabendo ao SUS, nos termos do art. 200, inciso III, “ordenar a formação de recursos humanos na área de saúde”;

Considerando que o art. 6º da Lei nº 8.080, de 19 de setembro de 1990, regulamentando a Constituição, estabelece que “estão incluídas ainda no campo de atuação do Sistema Ú nico de Saúde (SUS), inciso III – a ordenação da formação de recursos humanos na área de saúde”;

Considerando que o art. 12 da Lei nº 8.080, de 19 de setembro de 1990, prevê a criação de “comissões intersetoriais de âmbito  nacional  subordinadas  ao  Conselho  Nacional  de  Saúde (CNS), integradas pelos Ministérios e órgãos competentes e por entidades representativas da sociedade civil” e, no Parágrafo único que  “as  comissões  intersetoriais  terão  a  finalidade  de  articular políticas  e  programas  de  interesse  para  a  saúde,  cuja  execução envolva áreas não compreendidas no âmbito do Sistema Ú nico de Saúde (SUS)”;

Considerando  que  a  Comissão  Intersetorial  de  Recursos Humanos e Relações de Trabalho do Conselho Nacional de Saúde (CIRHRT/CNS) tem o papel de cumprir o art. 12 da Lei no 8.080, de 19 de setembro de 1990;

Considerando que o art. 13 da Lei nº 8.080, de 19 de setembro   de   1990,   define   que   “A   articulação   das   políticas   e programas,  a  cargo  das  comissões  intersetoriais  abrangerá,  em especial, as seguintes atividades, inciso IV – recursos humanos;

Considerando que o art. 14 da Lei nº 8.080 de 19 de setembro  de 1990,  determina que  “deverão  ser  criadas  Comissões Permanentes  de  integração  entre  os  serviços  de  saúde  e  as instituições de ensino profissional e superior”;

Considerando o art. 16 da Lei nº 8.080, de 19 de setembro de 1990, que versa sobre as atribuições da direção nacional do SUS a quem compete, conforme o inciso IX, “promover a articulação com    os    órgãos    educacionais    e    de    fiscalização    do    exercício profissional, bem como com entidades representativas de formação de recursos humanos na área de saúde”;

Considerando que o art. 27 da Lei nº 8.080, de 19 de setembro de 1990, garante que “A política de recursos humanos na área da saúde será formalizada e executada, articuladamente, pelas diferentes  esferas  de  governo,  em  cumprimento  dos  seguintes objetivos: I – organização de um sistema de formação de recursos humanos em todos os níveis de ensino, inclusive de pós-graduação, além da elaboração de programas de permanente aperfeiçoamento de pessoal”;

Considerando que o art. 1º, §2º da Lei nº 8.142, de 28 de dezembro  de  1990,  estabelece  que  o  SUS,  deve,  necessariamente, contar, em cada esfera de governo, sem prejuízo das funções do Poder Legislativo, entre suas instâncias colegiadas, com o Conselho de Saúde, em caráter permanente e deliberativo, órgão colegiado composto por representantes do governo, prestadores de serviço, profissionais  de  saúde  e  usuários,  que  atua  na  formulação  de estratégias  e  no  controle  da  execução  da  política  de  saúde  na instância  correspondente,  inclusive  nos  aspectos  econômicos  e financeiros, cujas decisões serão homologadas pelo chefe do poder legalmente constituído em cada esfera do governo;

Considerando o Edital MEC/SESU nº 04/1997 como marco histórico de elaboração de DCN numa perspectiva de construção social e política;

Considerando que o paradigma das DCN gerais para os cursos da área da saúde rompeu com os currículos mínimos e foi bem  fundamentado  pelo  Professor  Efren  de  Aguiar  Maranhão, Presidente da Câmara de Educação Superior do Conselho Nacional de Educação (CES/CNE) no ano de 2001;

Considerando a Resolução CNS nº 350, de 9 de junho de 2005,  que  aprova  critérios  de  regulação  para  a  autorização  e reconhecimento de cursos de graduação da área da saúde, tendo em perspectiva:  a)  as  necessidades  sociais  em  saúde;  b)  projetos político-pedagógicos coerentes com as necessidades sociais; e c) a relevância social do curso;

Considerando a Resolução CNS nº 515, de 7 de outubro de 2016, na qual o CNS se manifesta de forma contrária à autorização de todo e qualquer curso de graduação em saúde ministrado na modalidade a distância (EaD), bem como delibera que as Diretrizes Curriculares Nacionais (DCN) dos cursos da saúde sejam objeto de discussão e deliberação do CNS de forma sistematizada, em um espaço de tempo adequado para permitir a participação, no debate, das  organizações  de  todas  as  profissões  regulamentadas  e  das entidades e movimentos sociais que atuam no controle social; e

Considerando  as  competências  e  habilidades  necessárias para a formação dos profissionais de saúde, esta Resolução expressa pressupostos, princípios e diretrizes comuns para as DCN dos cursos de graduação da área da saúde e é resultado de uma construção coletiva e democrática, realizada nos anos de 2016 e 2017, pelo Grupo de Trabalho das Diretrizes Curriculares Nacionais (GT/DCN), aprovado na 286ª Reunião Ordinária do CNS, ocorrida em 6 e 7 de outubro de 2016, articulado com associações/ entidades nacionais de ensino, conselhos e federações profissionais, executivas estudantis, gestores do MEC e MS, entre outros, e coordenada pela Comissão Intersetorial  de  Recursos  Humanos  e  Relações  de  Trabalho  do Conselho Nacional de Saúde (CIRHRT/CNS). Resolve:

Art. 1º Reafirmar a prerrogativa constitucional do SUS em ordenar a formação dos (as) trabalhadores (as) da área da saúde.

Art. 2º Aprovar o Parecer Técnico nº 300/2017, em anexo, que apresenta princípios gerais a serem incorporados nas DCN de todos os cursos de graduação da área da saúde, como elementos norteadores para o desenvolvimento dos currículos e das atividades didático-pedagógicas, e  que deverão  compor o perfil  dos egressos desses cursos.

Art.  3º  Aprovar  os  pressupostos,  princípios  e  diretrizes comuns  para  a  graduação  na  área  da  saúde,  construídos  na perspectiva     do     controle/participação     social     em     saúde,     e apresentados, sinteticamente, nos incisos a seguir:

I – Defesa da vida e defesa do SUS como preceitos orientadores do perfil dos egressos da área da saúde, com os seguintes objetivos:

  1. formação em saúde comprometida com a superação das iniquidades  que  causam  o  adoecimento  dos  indivíduos  e  das coletividades,    de    modo    que    os    futuros    profissionais    estejam preparados para implementar ações de promoção da saúde, educação e  desenvolvimento  comunitário,  com  responsabilidade  social  e compromisso  com  a  dignidade  humana,  cidadania  e  defesa  da democracia,  do  direito  universal  à  saúde  e  do  SUS,  tendo  a determinação social do processo saúde-doença como orientadora;
  2. valorização  da  vida,  por  meio  de  abordagens  dos problemas de saúde recorrentes na atenção básica, na urgência e na emergência, na promoção da saúde e na prevenção de riscos e doenças, visando à melhoria dos indicadores de qualidade de vida, de morbidade e de mortalidade;
  3. formação  profissional  voltada  para  o  trabalho  que contribua para o desenvolvimento social, considerando as dimensões biológica,  étnico-racial,  de  gênero,  geracional,  de  identidade  de gênero, de orientação sexual, de inclusão da pessoa com deficiência, ética, socioeconômica, cultural, ambiental e demais aspectos que representam a diversidade da população brasileira.

II – Atendimento às necessidades sociais em saúde, considerando:

  1. a responsabilidade social das Instituições de Educação Superior (IES) com o seu entorno e o compromisso dos cursos da saúde com a promoção do desenvolvimento regional, por meio do enfrentamento dos problemas de saúde prevalentes e a organização de redes e sistemas inclusivos e produtores de integralidade;
  2. a    abordagem    do    processo    saúde-doença    em    seus múltiplos aspectos de determinação, ocorrência e intervenção, para possibilitar    que    a    atuação    dos    futuros    profissionais    possa transformar e melhorar a realidade em que estão inseridos.

III       Integração    ensino-serviço-gestão-comunidade,    de forma a promover:

  1. a inserção dos estudantes nos cenários de práticas do SUS e outros equipamentos sociais desde o início da formação, integrando a educação e o trabalho em saúde;
  2. a ampliação da rede de atenção em uma rede de ensino- aprendizagem, com vistas ao desenvolvimento dos (as) trabalhadores (as) e do trabalho em saúde;
  3. a diversificação de cenários de práticas, possibilitando aos discentes vivenciar as políticas de saúde, os fluxos de atenção em rede e de organização do trabalho em equipe interprofissional;
  4. a formalização da integração das IES com as redes de serviços de saúde, por meio de convênios ou outros instrumentos, que       viabilizem       pactuações       e       o       estabelecimento       de corresponsabilizações entre as instituições de ensino e as gestões municipais e estaduais de saúde;
  5. a  participação  dos  gestores  de  saúde  nas  instâncias decisórias das IES;
  6. a integração das ações de formação aos processos de Educação Permanente em Saúde (EPS) da rede de serviços;
  7. a participação ativa da comunidade e/ou das instâncias de controle social em saúde;
  8. que as DCN dos cursos de graduação valorizem a carga horária destinada aos estágios curriculares e às atividades práticas e de extensão;

i) a articulação entre as atividades de ensino, pesquisa e extensão  com  a  prestação  de  serviços  de  saúde,  com  base  nas necessidades     sociais     e     na     capacidade     de     promover     o desenvolvimento locorregional.

IV – Integralidade e Redes de Atenção à Saúde (RAS), observando-se os seguintes pressupostos:

  1. a integralidade como um dos princípios fundamentais do SUS, que possibilita acesso universal dos cidadãos aos serviços do sistema de saúde e que garante ao usuário uma atenção que abrange ações  de  promoção,  proteção  e  recuperação  da  saúde,  além  de prevenção e tratamento de agravos;
  2. a concepção de rede que rompe com o conceito de sistema verticalizado e fragmentado para trabalhar com um conjunto articulado de serviços básicos, ambulatórios e hospitais gerais e especializados;
  3. a formação em redes de atenção à saúde caracterizadas pela formação de relações horizontais entre os pontos de atenção com  o  centro  de  comunicação  na  Atenção  Primária  em  Saúde (APS),  pela  centralidade  nas  necessidades  em  saúde  de  uma população, pela responsabilização na atenção contínua e integral, pelo cuidado interprofissional, pelo compartilhamento de objetivos e compromissos com os resultados sanitários e econômicos;
  4. a APS como coordenadora do cuidado e ordenadora das RAS. Nesta perspectiva, a formação dos profissionais da saúde para atuar de forma efetiva, eficiente, eficaz e segura na atenção básica assume uma importância estratégica, devendo equilibrar conteúdos e propiciar o desenvolvimento de habilidades e atitudes, tanto em saúde  coletiva,  como  para  a  clínica/assistência  individual  em saúde.

V        Trabalho     interprofissional,     com     as     seguintes orientações:

  1. as DCN devem expressar a formação de um profissional apto a atuar para a integralidade da atenção à saúde, por meio do efetivo  trabalho  em  equipe,  numa  perspectiva  colaborativa  e interprofissional.    O    preceito    da    integralidade    aponta    para    a interdisciplinaridade, enquanto integração de diferentes campos de conhecimentos; para a interprofissionalidade, ocasião em que há intensa interação entre diferentes núcleos profissionais; e para a intersetorialidade,  envolvimento  de  diferentes  setores  da  sociedade no    atendimento    das    complexas    e    dinâmicas    necessidades    de saúde;
  2. os  Projetos  Pedagógicos  dos  Cursos  (PPC)  devem apresentar        estratégias        alinhadas        aos        princípios        da interdisciplinaridade,     intersetorialidade     e     interprofissionalidade, como  fundamentos  da  mudança  na  lógica  da  formação  dos profissionais e na dinâmica da produção do cuidado em saúde;
  3. as  DCN  devem  estimular  a  elaboração  de  projetos terapêuticos assentados na lógica interprofissional e colaborativa, reconhecendo os usuários dos serviços como protagonistas ativos e co-produtores  do  cuidado  em  saúde,  superando  a  perspectiva centrada em procedimentos ou nos profissionais.

VI – Projetos Pedagógicos de Cursos (PPC) e componentes curriculares coerentes com as necessidades sociais em saúde, observando-se:

  1. que as DCN considerem os fundamentos das principais políticas públicas que contribuem para a redução das desigualdades e  para  a  consolidação  do  SUS  como  sistema  universal,  integral  e equitativo;
  2. que os PPC sejam construídos com a participação ativa de representações de trabalhadores, discentes, usuários e gestores municipais/estaduais do SUS, tendo em perspectiva sua adequação ao  contexto  social  e  a  integração  dos  componentes  curriculares “intra” e “inter” cursos;
  3. a  relevância  de  que  os  PPC  e  os  componentes curriculares estejam relacionados com todo o processo saúde-doença e  referenciados  na  realidade  epidemiológica,  proporcionando  a integralidade e a segurança assistencial em saúde;
  4. a    inovação    das    propostas    pedagógicas,    incluindo explicitação dos cenários de práticas e dos compromissos com a interprofissionalidade, o gerenciamento dos riscos, a prevenção de erros e a produção de conhecimentos socialmente relevantes;
  5. abordagem  de  temas  transversais  no  currículo  que envolvam    conhecimentos,    vivências    e    reflexões    sistematizadas acerca  dos  direitos  humanos  e  de  pessoas  com  deficiência  ou mobilidade    reduzida,    Transtorno    do    Espectro    Autista    (TEA), educação ambiental, Língua Brasileira de Sinais (Libras), educação das  relações  étnico-raciais  e  história  da  cultura  afro-brasileira, africana, dos povos tradicionais e indígena;
  6. os pressupostos e fundamentos da promoção da saúde e seus determinantes, da Educação Permanente em Saúde (EPS), e das Práticas  Integrativas  e  Complementares  (PIC)  como  elementos constituintes  da  formação,  reafirmando  o  conceito  ampliado  de saúde;
  7. o fortalecimento das ações de promoção e proteção à saúde relacionadas à vigilância sanitária, epidemiológica, ambiental e à saúde do trabalhador;
  8. que os núcleos de conhecimento e práticas previstos nas DCN    considerem    temáticas    relacionadas    ao    envelhecimento populacional, às Doenças Crônicas Não Transmissíveis (DCNT), à segurança do paciente e à urgência e emergência, entre outras;
  9. a formação política e cidadã, que requer a realização de atividades  teóricas  e  práticas  que  proporcionem  informações  e promovam diálogos sobre as relações humanas, estruturas e formas de  organização  social,  suas  transformações,  suas  expressões  e  seu impacto  nas famílias,  grupos  e comunidades.

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