Instituto estadual recebe habilitação do MS para atender pacientes em busca de processo de transexualização


Serviço oferecido no IEDE é referência na rede pública de saúde, inclusive para outros estados

O ambulatório de disforia de gênero do Instituto Estadual de Diabetes e Endocrinologia Luiz Capriglione (IEDE) acaba de ser habilitado pelo Ministério da Saúde, juntamente com outros três serviços similares no país. Agora, são nove as unidades credenciadas pelo Sistema Único de Saúde (SUS) que oferecem o atendimento. O serviço do IEDE foi criado em 1999 e recebe pacientes que buscam o tratamento ambulatorial para um processo transexualizador, que inclui hormonioterapia. 

Em 2016, o ambulatório, único nestes moldes no estado, realizou 1.692 atendimentos. Os interessados precisam ter um encaminhamento médico ou de algum profissional de saúde mental e procurar um serviço municipal de saúde para que seja feito o agendamento no IEDE.

– O ambulatório de disforia do IEDE é um dos pioneiros no país e a habilitação do Ministério da Saúde traz uma chancela importante para o serviço, que tem sido cada vez mais procurado – disse o secretário de Estado de Saúde, Luiz Antônio Teixeira Jr.

 Após dois anos de tratamento, o paciente é avaliado pela equipe multidisciplinar, formada por endocrinologistas, psicólogo, psiquiatra, assistente social, clínico geral, ginecologista e fonoaudióloga, que emite um laudo referenciando-o, ou não, para a cirurgia de transgenitalização.

– No ambulatório, eles recebem o primeiro atendimento da endocrinologia e depois são direcionados para as outras especialidades. Muitos já se automedicaram antes de chegar aqui e isso pode trazer efeitos colaterais graves. No IEDE, eles usufruem do tratamento hormonal e recebem o laudo para se candidatarem à cirurgia, caso estejam aptos. Depois do procedimento, continuam com acompanhamento hormonal, psicoterápico e/ou psiquiátrico por pelo menos mais um ano e sem prazo determinado para serem acompanhados pelo endocrinologista – explica a coordenadora do setor, Karen De Marca.

Histórias compartilhadas

As histórias dos pacientes atendidos pelo ambulatório facilmente se entremeiam. Durante anos, eles buscaram informações de diversas formas para tentar entender sua identidade genética e anatômica e realizar mudanças que se adequem ao gênero com o qual se identificam. Tudo isso para suprir a necessidade de se sentir confortável e completo com o próprio corpo e reconhecê-lo como seu.

Foi a partir de um programa que assistiu, aos 13 anos, sobre Roberta Close que a técnica de enfermagem Luisa Soares, hoje com 27 anos, descobriu a possibilidade de mudança de sexo. Há um ano e meio, ela cumpre a rotina mensal de sair de sua casa em São Pedro da Aldeia, ainda de madrugada, para comparecer à consulta noIEDE.

– Desde pequena, sempre me senti diferente, não gostava dos meus órgãos genitais. Depois de assistir a essa entrevista, comecei a sonhar em ser uma mulher e procurei informações sobre isso. Minha mãe e irmã me apoiaram e, há um ano e meio, uma amiga médica me falou que a cirurgia era feita no Hospital Universitário Pedro Ernesto. Chegando lá, fui encaminhada ao IEDE para o tratamento hormonal – conta ela, que diz se sentir respeitada e acolhida na unidade – Não há discriminação aqui dentro. Me chamam pelo meu nome social e o fato de ter um serviço especializado nesse atendimento ajuda a conhecer pessoas que vivem as mesmas histórias que eu e podemos dividir experiências. Temos um grupo de troca de mensagens onde conversamos sobre o que passamos no dia a dia e até sobre oportunidades de trabalho, que são mais difíceis para pessoas com a nossa condição.

Boa parte das questões em comum são confirmadas no atendimento psicoterápico e psiquiátrico. De acordo com a psicóloga do projeto, Clarice Cesar Cabral, os relatos frequentemente envolvem um grande desconforto com o próprio corpo.

– Tratamos pacientes com diagnóstico de transtorno de identidade de gênero e que geralmente chegam aqui perdidos, fragilizados por conta da sua condição, com muitas questões relacionadas à autoestima. É frequente também a dificuldade de aceitação familiar, social e profissional, o abandono escolar precoce. Nesses casos, não basta mudar de gênero, é necessário que se sintam reconhecidos como tal – esclarece. 

A busca desse reconhecimento começou muito cedo na vida do estudante de Filosofia Ollie Barbieri, 24 anos, morador de Paciência. Desde criança, sentia-se um menino, gostava de se vestir com roupas masculinas e andar sem camisa. Quando chegou à adolescência, a questão se agravou, levando Ollie à depressão.

– Eu não sabia quem eu era. Me sentia de um jeito, mas minha família falava que eu era outra coisa. As adversidades e a falta de identidade me levaram ao fundo do poço. Sempre me senti desconfortável com o corpo que nasci, passei anos sem me olhar no espelho. Aos 14 anos, fui atrás de informações e li sobre a história de um famoso ativista transexual americano e comecei a entender o que era ser trans. Passei por um processo de autoaceitação, com a ajuda de psicólogos, e decidi ir atrás da transexualização – conta.

Ollie encontrou referências ao IEDE em comunidades transexuais em uma rede social. Em uma clínica da família recebeu o encaminhamento para a unidade. Foram apenas três meses até a primeira consulta.

– Não imaginava que havia esse tipo de atendimento na rede pública e é um tratamento muito caro se tivermos que pagar. Muitos fazem de forma clandestina e isso pode trazer consequências sérias. Aqui, aprendi sobre os meus direitos, os procedimentos que tinha que fazer para obter meu nome social. O IEDE se tornou minha segunda casa, onde me sinto acolhido, onde todos me respeitam – comemora ele. 

Referência para outros estados 

O tosador de animais Nathan Castro, de 30 anos, procurou informações sobre a mudança de sexo em grupos do movimento gay em Juiz de Fora, onde mora. Foi atendido em um hospital universitário, onde descobriu que teria que fazer o tratamento no Rio de Janeiro.

– Comecei a busca pela troca de sexo aos 15 anos, mas desde criança já me via diferente das outras meninas. Não me sentia à vontade na figura de uma mulher, usando roupas femininas. Comecei a tomar hormônio por conta própria, mas decidi procurar ajuda profissional. Cheguei no IEDE há um ano. Aqui, o atendimento é maravilhoso, tiram todas as minhas dúvidas, sou muito bem tratado. O tratamento está dando certo, mas até hoje só me sinto bem em me olhar no espelho quando estou vestido, por exemplo. Já comentei com a minha esposa que só ficarei totalmente confortável com a minha aparência quando o processo de mudança de sexo estiver completo – alega.

Assessoria de Imprensa

Comunicação Social

Secretaria de Estado de Saúde