Em debate promovido pelo Conass, especialistas defendem novas estratégias para a vacinação contra a Covid-19

Especialistas debateram a vacinação contra a Covid-19 com secretários estaduais de saúde e  assessores

Secretários estaduais de saúde participaram na segunda-feira (23), de uma roda de conversa sobre a vacinação contra a Covid-19. Promovida pelo Conass, o debate teve a participação dos médicos especialistas, Rosana Richtmann, Marco Aurélio Sáfadi, Renato de Ávila Kfouri e Júlio Croda, e foi mediado pelo vice-presidente do Conselho na Região Sudeste, Nésio Fernandes que classificou a iniciativa como “uma forma de empoderamento do colegiado de gestores estaduais, com o embasamento científico que diz respeito a posições importante e temas sensíveis ao enfrentamento da pandemia no País”.

Rosana Richtmann, médica infectologista e doutora em Medicina pela Universidade de Freiburg na Alemanha, falou sobre vacinação e reforço heterólogo, que é quando se administra uma vacina com plataforma tecnológica diferente da que foi usada para concluir o esquema primário de vacinação.

Ao apresentar dados de estudos em países como Alemanha, Espanha e Inglaterra, Richtmann ressaltou ser importante dizer que o reforço heterólogo já acontece muitas vezes com outras vacinas que não a da Covid-19, com bons resultados que demonstram maior resposta protetora. Ela observou que os próximos anos serão cruciais e determinantes para a definição de como utilizar esta estratégia já que, além da necessidade de acelerar a vacinação haverá também o surgimento de novas variantes do vírus.

Para falar sobre o intervalo entre doses dos imunizantes, o médico infectologista Marco Aurélio Sáfadi, destacou que os níveis de anticorpos necessários para prevenção nos desfechos mais graves têm se mostrado menores do que aqueles necessários para prevenir as formas leves da doença e a infecção. “Esse é um dos desfechos mais desafiadores, pois muitas vezes uma resposta imune específica será suficiente para nos proteger de formas graves, mas não para proteger da infecção”, observou Sáfadi que também é Membro da Câmara Técnica Assessora em Imunizações do Ministério da Saúde.

Sáfadi apresentou dados de estudos que mostram de maneira geral, que intervalos maiores entre as doses propiciam, após a segunda dose, melhor resposta imune contra a doença, mas refletiu: “será que a melhor resposta imune se traduz também por melhor eficácia? Será que corremos o risco de comprometer a efetividade ou eficácia da vacina ao estender demais o intervalo entre as doses?”, provocou.

Para ele, o Brasil atingiu boa cobertura com a primeira dose o que naturalmente remete à necessidade de implementarmos novas estratégias. “A antecipação da segunda dose tem de ser discutida, porém os estudos preliminares tanto para as vacinas de vetor viral (como a AstraZeneca), como de RNA mensageiro (como a Pfizer) têm uma melhor resposta com intervalos acima de 8 semanas. Também é necessário avaliar como será sua operacionalização, considerando os cenários de abastecimento das vacinas.  Sáfadi lembrou ainda que cabe avaliar que, com a presença da variante Delta, viveremos uma situação diferente da realidade atual e destacou ainda a necessidade de vacinação o quanto antes dos  adolescentes com comorbidade e imunodeprimidos, o que seria possível em em apenas um dia, uma vez que o total de adolescentes com comorbidades não seria superior a 1 milhão e meio.

O pediatra Renato de Ávila Kfouri, defendeu realizar a vacinação dos grupos de maior risco simultaneamente nas próximas semanas. Kfouri que é presidente do departamento de imunizações da Sociedade Brasileira de Pediatria e diretor da Sociedade Brasileira de Imunizações, ressaltou: “temos de começar logo a revacinar os idosos mais velhos, vacinar os adolescentes de risco, e garantir as segundas doses. Esse é um avanço necessário diante da inércia que estamos assistindo”.

Ele observou que no atual cenário nenhum grupo é desprezível no sentido de não ser vacinado e que apesar do risco de casos graves e óbitos em adolescentes sem comorbidade ser muito inferior ao de idosos, mesmo que já vacinados, os óbitos já ocorridos neste grupo pela COVID-19, são maiores que a soma de todas as demais doenças imunopreveníveis. “Portanto priorizar a vacinação dos grupos de maior impacto na  mortalidade é fundamental, mas todos precisarão ser contemplados”, disse.

Kfouri apontou que ainda existem lacunas de conhecimento, sendo necessários mais estudos  em relação ao intercâmbio de vacinas e clareza do benefício e tempo de efetividade da terceira dose. Todavia, “muitas decisões serão tomadas em cenários de ausência de evidências, como estão fazendo o Chile e outros países”, afirmou.

Já para o médico e doutor pela Universidade de São Paulo, e especialista em C&T Produção e Inovação em Saúde Pública da Fundação Oswaldo Cruz, Júlio Croda, a dificuldade de decisão frente à carência de evidências científicas e a rotatividade de cargos importantes no escopo da vacinação dentro do Ministério da Saúde são grandes  desafios. “Essa discussão técnica, este espaço, é fundamental, assim como a publicação de notas técnicas, que demonstrem as necessidades e a possibilidade de avançar com a vacinação no momento de chegada da variante delta”.

Ele explica que existem discussões em relação à efetividade, porém não há dados clínicos para as formas graves e por isso é difícil afirmar, do ponto de vista da utilização da vacina, qual seria o esquema heterólogo e em qual tempo ideal. “É um risco que muitos estados estão correndo. Os idosos predominam nas internações em alguns estados e, apesar da escassez de evidências, os gestores terão de tomar decisões ou então vamos continuar olhando para o passado, sem atitude proativa e vendo o caos, como vimos em Manaus com a variante Gama”, argumentou.

Croda destacou que as vacinas de RNA geram respostas imunes mais robustas, com forte correlação entre a produção de anticorpos neutralizantes e maior efetividade, especialmente para a redução das  hospitalizações e óbitos. Essas evidências mostram que idealmente, para uma população que não responde bem do ponto de vista imunológico: idosos e imunossuprimidos, a revacinação com vacinas de RNA produzem ou podem estimular uma resposta mais robusta”, esclareceu.

Diante das evidências de que a efetividade da vacinação está relacionada com a idade, Croda sugere já revacinar as pessoas com a resposta imune comprometida, os idosos residentes em casa de apoio, os mais idosos em ordem de idade decrescente e trabalhadores de saúde com mais de 60 anos, concomitantemente ao início da vacinação dos  adolescentes com comorbidades. “Justifica revacinar trabalhadores de saúde para reduzir transmissão no ambiente de trabalho e protegê-los de hospitalização e óbito. No entanto, é mais urgente o avanço da terceira dose nos grupos especiais”, explicou.

Todos os palestrantes enalteceram a iniciativa do Conass de realizar o debate com vistas a elaborar um documento que indique a condução da vacinação contra Covid-19 nos estados considerando, principalmente, o avanço da variante Delta.

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