Equidade Racial, Saúde Digital e mecanismos jurídicos são destaque na reunião da  CTQCSP

A Câmara Técnica do Conass de Qualidade no Cuidado e Segurança do Paciente, reuniu nesta terça-feira (05), em Brasília, os técnicos das Secretarias Estaduais de Saúde (SES). Coordenada pela assessora técnica do Conass, Carla Ulhoa, a reunião antecede o Seminário em alusão ao Dia Mundial de Segurança do Paciente que será realizado amanhã, 06 de setembro na sede do Conselho.

A necessidade de pensar a transversalidade da Segurança do Paciente em toda a rede do Sistema Único de Saúde (SUS) e como é possível inseri-la nas questões étnicos raciais foi levantada pelo assessor para Equidade Racial em Saúde do Ministério da Saúde, Luiz Eduardo Batista.

Ele levantou a reflexão sobre como discutir com os profissionais de saúde e como levar para o SUS a questão étnico racial na atenção ao cuidado da população. “Não estamos acostumados a ouvir sobre isso nos nossos espaços de formação. Por isso precisamos provocar esse debate trazendo-o para o campo da saúde”, afirmou.

Segundo ele, conversar diretamente com os técnicos das SES é também conversar com os mais de cinco mil municípios do País. “Aqui eu consigo olhar e ver as dificuldades que poderemos ter e falar livremente sobre o que é ou não possível. Isso é fundamental para pensarmos essa política tão cara para nossa população, mas que ainda é invisível para a sociedade”, disse Batista.

Para o assessor é necessário também pensar no princípio da equidade do SUS quando se trata das questões relacionadas às populações. “No campo da saúde coletiva, onde estão esses grupos populacionais nos processos que tanto falamos? Que acessos eles têm aos serviços de saúde? Se estamos discutindo determinação social sem olhar para algumas populações elas acabam ficando à margem e mesmo quando falamos em equidade no SUS isso se torna um desafio para nós”.

Um dado apresentado por Batista chamou a atenção. Segundo o Ministério da Saúde, sinais e sintomas mal definidos estão entre as cinco principais causas de morte nas populações parda, preta e indígena nos anos de 2010, 2015 e 2020. “O que esse dado quer nos dizer? Morrer sem causas definidas significa falta de acesso e de qualidade na atenção”,  alertou.

  Batista concluiu sua fala solicitando aos representantes das secretarias que ao fazerem seus planejamentos, olhem com atenção para as diferenças que existem dentro de um mesmo território. “Fazer igual para todo mundo é perpetuar desigualdades entre homens, mulheres, negros, brancos e indígenas. Ao fazer os planejamentos nos estados, prestem atenção em que tipo de serviço é ofertado a esses diferentes grupos populacionais”, provocou.

 Saúde Digital

Como fortalecer a cultura da Segurança do Paciente a partir da Saúde Digital? Osmeire Chamelette, que é membro da diretoria da Sociedade Brasileira de Informação em Saúde e da Câmara Técnica de Enfermagem Digital abordou os benefícios da Saúde Digital e como ela pode contribuir na melhoria da qualidade do cuidado do paciente em vários aspectos, como na prevenção de erros, no gerenciamento de riscos e na melhoria da qualidade ao permitir uma gestão eficiente e baseada em evidências.

Chamelette pontuou, no entanto, que apesar das possibilidades de aprimorar a segurança do paciente, a saúde digital ainda enfrenta alguns desafios para a sua implementação. Muitos deles estão relacionados à resistência de profissionais e pacientes às mudanças advindas da tecnologia e às dificuldades financeiras para aquisição, manutenção e treinamento para soluções digitais de saúde.

A ética no uso das ferramentas digitais também foi citada pela enfermeira. Segundo ela, é preciso garantir a privacidade do paciente e a continuidade do cuidado, sem perder a autonomia e o cuidado humanizado. “A saúde digital é o futuro. Temos que sempre estimular o uso dessas ferramentas para aumentar a quantidade de dados, mas elas não podem substituir o contato humanizado na saúde”, concluiu.

Mecanismos Jurídicos e Segurança do Paciente

Outro destaque da reunião foi a participação da Diretora do Instituto Brasileiro de Direito do Paciente (IBDPAC), Aline Albuquerque, que falou sobre mecanismos jurídicos para lidar com a segurança do paciente e com os danos a eles causados decorrentes dos cuidados em saúde. “Precisamos aproximar o Direito da Segurança do Paciente, sensibilizando também os gestores de que não é normal um sistema de saúde que causa dano e mortes. Esta área tem que extrapolar seus muros e precisa ser tratada com elevada prioridade”, disse.

Albuquerque apresentou dados de 2021, do Segundo Anuário de Segurança Assistencial Hospitalar no Brasil que mostram que a cada um minuto, cinco pacientes morrem por erro associado aos cuidados em saúde.

Ela fez uma reflexão sobre o que queremos enquanto sociedade em relação à prevenção e à reparação de danos e enfatizou que no Brasil, diferente de alguns países, o Direito tem uma base patrimonialista e não enxerga o paciente a partir da ótica da empatia, mas sim da compensação financeira.

Para exemplificar como alguns países lidam com a questão, Albuquerque exibiu mecanismos jurídicos que eles já utilizam e que têm como objetivo concorrer para melhorias em segurança do paciente e resolver conflitos derivados de eventos adversos: mecanismos de profissionais de ligação e solução informal de conflitos; mecanismos de sistema de queixa de pacientes; mecanismos de compensação de danos sem culpa e mecanismos de disclosure.

Um exemplo que chamou a atenção foi um utilizado pelo NHS, o Serviço Nacional de Saúde do Reino Unido, onde o paciente, caso esteja pensando em apresentar uma queixa, um advogado do próprio Sistema o ajuda a escrevê-la e participa das reuniões. Este advogado, no entanto,não pode apresentar a queixa em nome do paciente, nem dar aconselhamento médico ou jurídico, mas pode apoiá-lo em qualquer fase do processo, além de estar presente em todas as áreas do NHS.

A presidente do IBDPAC também apresentou outras experiências positivas do Canadá, Dinamarca e Holanda e enfatizou que elas diminuem a litigância na saúde. “Nesses países geralmente as pessoas litigam porque querem ouvir um pedido de desculpas ou querem apenas saber o que realmente aconteceu. A reparação financeira não é a principal causa desses litígios”.

Para ela, estes mecanismos judiciais têm total condição de serem implementados no Brasil, pois o SUS tem maturidade suficiente. “Todos esses exemplos podem ser feitos no nosso sistema de saúde pública que não tem até hoje, nenhum mecanismo de prevenção de litígio. Precisamos nos conscientizar que eles auxiliam na melhoria do cuidado e implementá-los não envolve grandes gastos. Acredito no SUS e cabe a ele implementar essas mudanças”, concluiu.

Para a coordenadora da Câmara Técnica do Conass de Qualidade no Cuidado e Segurança do Paciente, a assessora técnica, Carla Ulhoa, é fundamental que os técnicos das Secretarias Estaduais de Saúde, ao voltarem para os estados, procurem seus núcleos jurídicos para repassar o que foi discutido na reunião, pois a Segurança do Paciente, na sua transversalidade, tem tudo a ver com a judicialização. “Este é um dos maiores gargalos para os gestores do SUS. O objetivo desta reunião é que a gente comece a pensar nesses mecanismos e em estratégias para implementá-los, por isso é fundamental que iniciemos essa discussão com os secretários e com o Ministério da Saúde”, observou.

A reunião também abordou outros temas como o Comitê para Promoção do Uso Racional de Medicamentos e o Projeto PlanificaSUS – Segurança do Paciente na Atenção Primária em Saúde e Atenção Ambulatorial Especializada.

Amanhã, os atividades da CTQCSP continua com a participação dos técnicos das SES no Seminário Dia Mundial de Segurança do Paciente.

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