Diálogos Conass: especialistas traçam estratégias para a vacinação contra a Covid-19 em 2023

Esquema vacinal completo, redefinição de público-alvo e utilização de vacinas bivalentes foram alguns dos apontamentos levantados por especialistas

A perspectiva para a vacinação contra a Covid-19 em 2023, a partir de questões norteadoras, como a existência de elementos que permitam a definição de um calendário de vacinação, foi o tema da sessão Diálogos Conass, que aconteceu na manhã desta quinta-feira (17).

Com a participação do pesquisador de Saúde Pública da Fiocruz, Marcelo Gomes e dos pediatras Marco Sáfadi e Renato Kfouri, o debate apontou tendências de comportamento da Covid-19 e quais as possíveis estratégias a serem colocadas em prática em relação à vacinação da população para o próximo ano.

O presidente do Conass, Nésio Fernandes, destacou que a participação dos especialistas neste diálogo é fundamental para a construção de elementos sólidos e profundos que norteiem a posição da instituição em relação ao tema.

 

Aumento de Casos

O pesquisador da Fiocruz e coordenador do Boletim Infogripe, Marcelo Gomes, apresentou dados que mostram aumento significativo nos casos positivos para SARS COV-2 nas últimas semanas. Os dados revelaram ainda o impacto da vacinação, por faixa etária, nos óbitos e internações pela doença. “Percebemos uma diferença significativa entre não vacinados, vacinados com apenas uma dose e aqueles que já tinham pelo menos uma dose de reforço”, observou.

Ao analisar os números apresentados, Gomes ressaltou que está cada vez mais claro que os picos da Covid-19 não acontecerão apenas uma vez por ano, o que sugere mudança na estratégia de vacinação. Uma delas seria oferecer à população mais vulnerável (idosos e imunossuprimidos), uma primeira etapa de imunização em outubro e, em um segundo momento, uma vacinação mais ampla junto com a vacinação contra a influenza, por exemplo. “O fato de estarmos caminhando para o cenário de dois picos anuais da doença, sugere que haja dois momentos de vacinação, especialmente para a população mais vulnerável. Essa talvez, seja uma estratégia importante a se considerar”, ressaltou.

Imprevisibilidade da doença

Para o pediatra Renato Kfouri, que é também presidente da Sociedade Brasileira de Pediatra (SBP), é preciso ter em mente que todo o conhecimento que se tem sobre Covid-19 ainda é um conhecimento em construção. “Há sempre um alto grau de imprevisibilidade em qualquer suposição e/ou afirmação em relação ao prognóstico da vacinação para 2023”, afirmou.

Kfouri falou sobre as lições aprendidas com a pandemia, destacando a necessidade de se ter um olhar diferenciado para a população mais vulnerável e também ao tempo de proteção das vacinas. “São conceitos fundamentais que devemos ter em mente quando pensarmos nessas estratégias”.

O pediatra avaliou ainda os cenários das variantes de preocupação e observou que as subvariantes da Ômicron vieram para ficar, mas ressaltou que uma variante sozinha não provoca uma nova onda. “Tivemos muito mais variantes do que ondas, mas tivemos uma variante nova em uma população que já acumulou um período de perda de proteção das vacinas, em um cenário que não se usa mais máscaras e nem se pratica o distanciamento social. Essa combinação de fatores que fazem com que essas novas ondas, como a que estamos vivendo, ocorram”, explicou.

Kfouri chamou a atenção para a necessidade da incorporação de vacinas bivalentes que, segundo afirmou, já são utilizadas em outros países e são, atualmente a melhor opção de imunizantes para doses de reforço. Ele também afirmou ser necessário discutir, no âmbito do Ministério da Saúde, à luz do debate sobre eventos adversos, a utilização de doses nacionais da Astrazeneca como dose de reforço”.

Para o presidente da SBP é importante estar ciente de que, apesar de já haver duas opções de vacinas bivalentes submetidas à Anvisa, elas não estarão disponíveis para a atual onda da doença. “Não teremos outras vacinas além das já incorporadas ao Programa Nacional de Imunizações (PNI). Devemos concentrar esforços em reforçar a necessidade de se ter os esquemas vacinais completos. Em 2023 já passada essa onda, assim que as vacinas bivalentes chegarem, deveremos vacinar novamente e assistir a outra onda de sazonalidade, mas dessa vez com uma população mais vulnerável já protegida com as vacinas bivalentes”.

Para o presidente do Departamento de Infectologia da SBP, Marco Sáfadi, é importante ressaltar que as vacinas propiciaram, em um primeiro momento quando ainda não havia casos de variantes de preocupação, resultados de efetividade que foram contundentes não só para formas graves, mas para formas leves e inclusive para a infecção.

Sáfadi observou, no entanto, ser necessário compreender que o cenário atual de gravidade da doença, é diferente do que foi no passado, o que altera as recomendações sobre as ações que devem ser colocadas em prática. “Esse é o principal aprendizado que temos que incorporar. O que valeu no passado, de vacinar todo mundo, talvez hoje já não seja o ideal. É possível que tenhamos que revisitar essas decisões frente ao cenário que temos”.

Sobre o uso das vacinas bivalentes, disse ser inevitável que tenhamos que nos valer desses imunizantes em um futuro próximo.

Para ele, muitas recomendações que serão tomadas terão de ser pautadas pelo perfil de comportamento da doença daqui para frente, sendo necessário privilegiar os grupos mais vulneráveis.

Sáfadi também enfatizou ser fundamental a vacinação de crianças de todas as idades, sem definição de grupo, e foi categórico ao afirmar que, ao contrário do que tem sido colocado, há dados consistentes que comprovam que a Covid-19 tem alto impacto nas mortes e hospitalizações de crianças no país. “Elas têm sim que ser contempladas em uma vacinação inicial”, afirmou.

Vacinas Bivalentes (atualizadas)

Sobre o papel das vacinas bivalentes no atual cenário da pandemia, o presidente do Conass, Nésio Fernandes, corroborou a opinião dos especialistas ouvidos no debate, mas chamou a atenção para um aspecto relevante no que diz respeito à percepção da população sobre a vacinação. “Precisamos ter cuidado ao comunicar a população sobre vacinas atualizadas, pois este termo remete ao conceito de que algo está desatualizado, o que pode levar as pessoas a não se vacinarem com os imunizantes que temos disponíveis hoje.  O que temos de real no momento são vacinas já incorporadas e precisamos fazer com que a população atualize o seu esquema vacinal, pois temos um percentual muito alto de população que não tomou a 3ª e/ou 4ª dose”.

Assim como os demais debatedores, Fernandes observou que existem mais dúvidas do que certezas em relação à Covid-19, no entanto, afirmou que as certezas são capazes de orientar decisões e uma delas é que as vacinas são as melhores opções para o enfrentamento da doença. “Precisamos tomar decisões e definir um calendário de vacinação para fins de saúde pública no país”, concluiu.

Ao encontro do que falou o presidente do Conass, Marco Sáfadi disse que a mensagem mais importante a ser passada é a de que não haverá, em um curto espaço de tempo vacinas bivalentes, e já há dados que comprovam que a proteção das vacinas existentes atualmente, frente às variantes BA.4 e BA.5, se mantém para as formas graves da doença. “É muito melhor se valer da vacina que está disponível e atualizar a dose de reforço do que esperar por uma vacina adaptada que a gente não sabe quando vai chegar”, afirmou.

Encaminhamentos

Para o secretário executivo do Conass, Jurandi Frutuoso, é fundamental, do ponto de vista da gestão, ter uma orientação única para os gestores que irão assumir em janeiro de 2023. “Estamos vivendo uma transição federal e estadual e seria de suma importância apresentarmos a esses novos gestores, inclusive também ao grupo de transição da saúde, um documento consensuado com tudo o que foi discutido neste debate hoje”, observou.

Renato Kfouri, Marco Sáfadi e Marcos Gomes assentiram com a proposta e, veementemente, ressaltaram a importância do retorno do protagonismo do PNI, orientando a todos a partir de discussões democráticas.

Para o assessor técnico do Conass, Nereu Henrique Mansano, uma das bases do PNI sempre foi a Câmara Técnica de Assessoramento em Imunização (CTAI). “Juntamente com o fortalecimento do PNI teremos que recompor a CTAI, para então, construirmos uma proposta da gestão estadual a partir das estratégias aqui propostas”.

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