SUS: a hora é agora

O Sistema Único de Saúde é fruto da ação dos sanitaristas brasileiros que embalados pela vontade de ver o Brasil transformado, emergiram da luta contra a ditadura com a ideia concebida de construir um país includente política e sanitariamente. A Constituinte de 1987 acolheu as ideias e a Constituição de 1988 escreveu saúde como “direito de todos e dever do Estado”.

 

O Congresso Nacional, embora conservador, sob forte pressão, com uma mão criou um sistema de saúde de inspiração socialista e com a outra negou-lhe o financiamento necessário à sua efetivação. A contradição estava dada na origem. O subfinanciamento que esmaga o Sistema Único de Saúde (SUS) e dificulta sua evolução é, portanto, filho da intenção e não do acaso. É produto de uma sociedade oligárquica e capitalista que tem pouca ou quase nenhuma sensibilidade social.

 

A crise atual do sistema não é fruto de erro de concepção, mas da impossibilidade técnica em efetivar os preceitos constitucionais que são a base do SUS: universalidade, equidade e integralidade na assistência. O acúmulo epidemiológico, a transição demográfica, o incremento tecnológico, o modelo assistencial com foco em doenças agudas pressionam o sistema e exigem a definição sobre qual modelo institucional o Brasil quer instituir e quanto a sociedade está disposta a pagar por ele. Este dilema necessita ser superado!

 

O mundo se debate a procura de fórmulas que conciliem a necessidade da população por mais saúde e os custos já inalcançáveis para muitos países. A pressão por mais qualidade advinda da maior conscientização das pessoas e do incremento tecnológico não combina com a pressão inflacionária e as necessidades crescentes do setor. Nos Estados Unidos as projeções são de gastos superiores a 20% do Produto Interno Bruto americano em 20201 e mesmo assim não dão conta da pressão do mercado. Isso mesmo: do mercado. E é pra lá que querem nos levar. Transformar a saúde do Brasil em campo de prática da medicina privada subsidiada com recursos públicos é objetivo de muitos. Haja vista a renuncia fiscal dada aos planos privados que já ultrapassa 15 bilhões de reais por ano.

 

Os nossos desafios, no entanto, devem ser enfrentados e o SUS pode continuar evoluindo se a participação do governo federal for justa e a reposição dos recursos garantida já. Superar o subfinanciamento crônico do setor é uma obrigação da União que aos poucos se demite desse compromisso comprometendo há anos apenas 1,75% do PIB2, bem abaixo dos gastos de outros países com sistemas de saúde ditos universais. É inconcebível que apenas 44% dos recursos públicos do setor venham desta esfera, enquanto estados e municípios, que juntos amealham menos de 50% das receitas disponíveis, arquem com as obrigações advindas da descentralização da saúde. Precisa que no rastro do sucesso da saúde, responsável por mais de 11% dos empregos formais do país (mais de 3 milhões – IBGE, 2009, sendo 1.7 milhões públicos) e por 10% do PIB nacional surja a vontade política para fazer do setor prioridade de fato.

 

O SUS tem o reconhecimento mundial pelo programa de imunização, DST/AIDS, transplante, medicamentos, expansão de cobertura na Atenção Primária com mais de 30.000 equipes de Saúde da Família e outro tanto de saúde bucal e uma extensa rede assistencial. Tudo isso foi implantado em 25 anos num país de dimensões gigantescas, com desigualdades regionais gritantes, diferenças sociais tão evidentes que nos faz perguntar como isso foi possível acontecer. Por isso, vamos precisar de todos (gestores, trabalhadores, sociedade, etc..) para efetivá-lo, pois nenhuma sociedade evoluirá se as ‘partes’ atuarem isoladamente. É necessária ação conjunta fruto da consciência coletiva onde a responsabilidade social seja a marca da solidariedade. A direção será ditada pela nossa responsabilidade e o resultado produto da nossa decisão.

 

1-PricewaterhouseCoopers Health Institute, 2006

2- Câmara dos Deputados – Nota Técnica nº 012, 2013

 

Dr. Jurandi Frutuoso, médico e Mestre em Saúde Coletiva (UnB).

CRM: 3221

 

 

Por Assessoria de Comunicação, da revista Santa Casa da Misericórdia de Fortaleza